APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS
O aprendizado de línguas, juntamente à tradução da Palavra, é uma área de gritante necessidade de atenção em nossos cursos de formação de obreiros transculturais.
Primeiramente pela óbvia necessidade do obreiro
transcultural aprender uma nova língua para sobreviver, se relacionar e expor o
evangelho, enfim: comunicar-se.
O segundo motivo possui uma gravidade extra, e
também histórica. Quando pensamos sobre o grupo que identificamos como PNAs
(Povos Não Alcançados) surge uma pergunta crucial: “Porquê os PNAs permanecem
não alcançados ainda em nossos dias ?” Seria pela falta de conhecimento
etnológico: quem eles são, quantos são, onde estão e como chegar até eles ?
Na verdade o motivo circula ao
redor de barreiras humanas. Fala-se que 80% dos povos considerados não
alcançados já eram bem conhecidos mais de 10 anos atrás e constavam na lista de
diferentes agências e juntas missionárias ao redor do mundo. Se ainda
permanecem não alcançados, isto deve-se à existência de barreiras que os mantém
dentro de uma retoma quase intocável. Estas barreiras são lingüísticas,
antropológicas, missiológicas, políticas, geográficas, religiosas e
espirituais.
Pela seleção natural quanto aos
povos a serem alcançados ao longo das décadas, os que permanecem não alcançados
neste fim de milênio podem ser considerados o ‘remanescente mais difícil’.
Grande parte destes PNAs já sofreram algum tipo de tentativa de contato
missionário ou exposição do evangelho no passado, sem sucesso, colocando-os na
categoria de ‘mais difíceis’ em algum nível, e muitos deles a nível
lingüístico.
Um exemplo simples poderia ser
dado quanto às tribos ao norte de Gana na África. Aquelas que permanecem não
alcançadas são nitidamente as que possuem línguas mais complexas, são
culturalmente mais isoladas, influenciadas pelo Islã ou habitam regiões
geograficamente mais isoladas. As mais resistentes ao evangelho, direta ou indiretamente,
formam hoje o seleto grupo de PNAs e isto coloca um peso extra na
responsabilidade de formar hoje a força missionária.
Quando falamos sobre
Aprendizagem de Línguas estamos tratando sobre um ponto vital na comunicação
missionária. Em média o missionário que envolve-se com um grupo pouco
evangelizado fora do nosso país necessitará, no mínimo, de aprender duas novas
línguas: a primeira delas chamamos de ‘básica’ (inglês, francês, árabe etc) que
será usada para se estabelecer em um novo país onde habita o grupo alvo; a
segunda delas chamamos ‘missiológica’ e é justamente a língua ou dialeto do
grupo alvo. Em muitas circunstâncias o grupo alvo pode usar mais de uma língua
ou dialeto criando novas ramificações.
Há portanto grande necessidade
de investirmos a nível linguístico-prático na formação de nossos obreiros
transculturais: enfatizar um bom curso de aprendizagem de línguas; expô-los à
uma segunda língua, desafiá-los a romper a barreira da adaptação lingüística,
ensinar-lhes fonética, fonologia, morfologia e conceitos de tradução da
Palavra, mesmo que informal e para transmissão verbal do evangelho. Enfim,
dar-lhes as ferramentas.
Do ponto de vista lingüístico
há uma grande diferença entre o ideal missionário e a realidade missionária. Um
exemplo pessoal. Quando chegamos em Gana fomos desafiados a trabalhar com um
grupo conhecido como ‘Konkombas’ que, segundo os registros, falavam uma
variação de 4 ou 5 dialetos. Chegando até eles e conhecendo-os de perto vemos
hoje que ‘Konkombas’ é apenas uma expressão estrangeira sendo esta uma palavra
totalmente desconhecida e sem sentido para a própria tribo. Também não são uma
tribo mas algo que poderíamos chamar de ‘Nação Tribal’: um agrupamento de
etnias irmãs sem concentração social mas com interesses comuns, onde são
faladas 23 línguas e 64 dialetos diferentes, apenas dentre os grupos e sub
grupos que conseguimos estudar. Nós hoje trabalhamos com 1 destes 23 grupos
(que para facilitar a comunicação no Brasil continuamos a tratar como
‘Konkombas’) que se auto-entitula Bimonkpelnn onde são falados 9 diferentes
dialetos, alguns tão distantes ao ponto de necessitarmos em média de três
intérpretes a cada culto, apenas entre os ‘Bimonkpelnn’. A realidade não
romântica do campo força-nos a investir na formação lingüística de nossos
obreiros pois as barreiras existem para serem ultrapassadas e foi-nos confiada
esta tarefa.
Formação missiológica ou
Treinamento missionário ?
Gostaria de concluir propondo
fazermos uma diferenciação curricular entre formação missiológica e treinamento
missionário.
Uma diferença inicial e a mais
visível seria de Objetivo. A primeira tem como alvo formar missiólogos,
pensadores dos princípios que regem a missão, entre os quais estão muitos
pastores e vários professores de missões além de executivos de agências
missionárias. Estes precisam compreender, visualizar e traçar estratégias. Já o
Treinamento missionário tem como alvo aqueles que em um certo momento ver-se-ão
na linha de frente face a face com um povo, nação, grupo social ou etnia com os
quais precisarão se relacionar passando por todo o processo de interação social
com a finalidade de, após muitas fronteiras serem cruzadas, propor-lhes o
evangelho. Estes também precisam compreender, visualizar e criar estratégias
mas é necessário ir além. Precisam de ferramentas práticas com as quais
trabalhar. Não basta saber da existência de línguas foneticamente complexas, é
necessário aprender como articulá-las; não basta conhecer os exemplos clássicos
de diferenças culturais, é preciso conhecer o método de mapeá-las; não é
suficiente apenas o conhecimento missiológico de exposição temática do
evangelho, é preciso saber como fazer. O treinamento missionário precisa ir
além da formação missiológica da mesma forma que um médico, além de anos de
estudo e conhecimento precisa realizar a ‘residência médica’ e se especializar
antes de estar hábil a ir ao campo de trabalho.
O missiologo se satisfaz quando
encontra a resposta da sua pergunta, mas o missionário precisa testar a
resposta no campo e vê-la funcionar. Os que precisam de formação missiológica
tem os olhos voltados para a sistematização enquanto os que procuram um
treinamento missionário atentam para a aplicabilidade.
É necessário caminhar.
Implementar e traduzir para a realidade das nossas escolas de missões os
desafios que conhecemos. Seja na formação de missiólogos ou no treinamento
missionário que seja visto em nós, missões brasileiras, o genuíno caráter de
Cristo. Isto revelará que não apenas conhecemos o caminho, mas também andamos
por ele. Deus nos abençoe.
Rev: Ronaldo Lidório
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