E A PAIXÃO MISSIONÁRIA, ONDE FOI PARAR?
Meu chamado missionário deu-se na adolescência. Em nossa igreja sempre havia
missionários que por lá passavam e contavam-nos suas experiências adquiridas
nas mais diversas partes do mundo.
Foi ali, no
convívio da igreja, que ouvi falar do mundo islâmico, budista, hindu e
comunista. No seio da igreja sonhei com os campos missionários e com a
possibilidade de glorificar a Deus com minha vida. Nesta ocasião era
praticamente impossível ler Mateus 28:19-20 sem as lágrimas virem aos olhos.
O tempo
passou, o adolescente cresceu e o sonho tornou-se realidade. Tive o imenso
privilégio de servir ao Senhor no mundo hindu por vários anos e nos últimos
sete anos num contexto pós-cristão da Europa. Minha paixão pela missão continua
a mesma, apenas mais amadurecida, já com alguns fios de cabelos brancos, e
ainda hoje é impossível ouvir alguém falar de missões entre outros povos sem
que as lágrimas me venham aos olhos.
Nestes quase
quinze anos fora do Brasil e envolvido com a obra missionária, foram raras as
oportunidades de voltar à “pátria amada”. No entanto, a cada retorno foi
possível notar um esfriamento cada vez maior da paixão missionária.
Lembro-me da
ocasião em que as pessoas nos procuravam desejosas de saber sobre os povos do
mundo e das necessidades missionárias. Já na minha última viagem ao Brasil a
pergunta mais comum era: “Europa, interessante, lá é bom mesmo para se ganhar
dinheiro?” Aliás, acredito que as necessidades missionárias da Europa sejam as
mais desconhecidas da igreja brasileira.
Quantos
brasileiros sabem das milhares de cidades da Europa sem uma única igreja
cristã? Só no pequeno Portugal são quase cinqüenta cidades sem igrejas.
O sentimento
que tenho é que a igreja brasileira assumiu a sua responsabilidade, mas perdeu
a paixão. Da última vez que lá estive raras eram as pessoas interessadas em
falar sobre missões. Faz-se missões, mas não mais refletimos sobre o assunto.
O resultado é
um distanciamento daquilo que hoje acontece no mundo missionário, suas novas
tendências, os novos alvos e, acima de tudo, nada se fala dos mais de doze mil
povos não alcançados e muitos ficam espantados ao ouvir que ainda hoje
missionários e cristãos são mortos ou lançados em prisões por causa do
Evangelho, para estes, estas coisas de perseguição não passam de alguns relatos
do Novo Testamento.
Hoje o
missionário é um problema que a igreja brasileira tenta administrar dentro das
suas prioridades locais. O assunto administra-se da maneira mais conveniente
possível, conveniente para a igreja local, não para o missionário.
Nós,
brasileiros, gostamos da glória da missão, não do custo da missão. Gostamos de
dizer que o “Brasil é o Celeiro do Mundo”, mas nos esquecemos de dizer que os
missionários brasileiros estão entre os que menos recursos recebem de suas
igrejas, e que raríssimos são os casos dos que possuem algum plano de
aposentadoria.
Lembro-me da ocasião em que nos reunimos na Noruega. Éramos um grupo de
cinqüenta brasileiros envolvidos com missões, sentíamo-nos o grupo mais
especial do mundo, até que ouvimos o reitor da faculdade missionária da Noruega
que, com detalhes e aquela humildade típica dos noruegueses, falou-nos como
fazer missões de verdade, e contou-nos sobre a missão desenvolvida por
missionários noruegueses em Madagascar ao longo dos anos, onde estão sepultados
ao menos mil e quinhentos missionários noruegueses, mortos pelos mais variados
motivos. A igreja brasileira ainda está muito longe da realidade do custo da
missão.
Outra coisa importante a aprender com os nórdicos sobre como fazer missões está
no tratamento que recebe o missionário norueguês. Em sua maioria possuem os mesmos
direitos sociais e financeiros dos pastores locais. Isto significa que, após
uma determinada idade, os missionários poderão contar com uma pensão vitalícia
que garantirá o sustento na velhice e a garantia de provisão para a família.
No caso
brasileiro, a menos que o missionário faça contribuições por conta própria para
a previdência social ou privada, chegará à velhice em uma situação
constrangedora. Mas como a igreja brasileira ainda é muito nova no seu
envolvimento missionário, pouco se pensa sobre este assunto. Não posso deixar
de elogiar algumas juntas missionária e igrejas que agem diferente nesta
questão e investem no futuro de seus obreiros.
Como podemos
ver, a questão da missão é muito mais séria que enviar cinqüenta reais ou mil
reais por mês para um missionário no campo. É uma questão de consciência missionária, de real
envolvimento com todos os aspectos da vida do missionário, afinal, “digno é o
trabalhador do seu salário” (Lc 10:7).
Lembro-me da
irmã Hanna, uma missionária aposentada, membro da nossa igreja na Noruega que,
depois de mais de quarenta anos de serviço missionário na África, gozava de sua
velhice a tocar piano em casa e nos lares de idosos que ela visitava
semanalmente, como uma forma de manter-se ativa. Um dia numa conversa com ela
fiquei surpreendido ao ouvir desta irmã que todos os seus mantenedores que a
apoiaram quando ela saiu para missões na África, os que ainda viviam,
continuavam a lhe enviar ofertas mensais, mantendo um lindo relacionamento
entre mantenedor e missionário por mais de cinqüenta anos.
Será que no
Brasil algum dia ouviremos histórias assim de nossos missionários? No meu caso,
um anos após ter saído para Índia, dos que se comprometeram comigo, 60%
acabaram por desistir.
É tempo de repensar nosso envolvimento missionário, restaurar a paixão perdida,
buscar aprender com outros povos como fazer missões de forma efetiva e
duradora. O orgulho missionário brasileiro de nada serve, só nos atrapalha.
Não somos o
celeiro do mundo missionário, países menores e mais pobres que o Brasil, como a
Argentina, por exemplo, enviam e sustentam mais missionários que nós.
A Coréia do
Sul possui mais de doze mil missionários em mais de cento e cinqüenta países do
mundo, e o número tende a crescer. O cuidado da igreja coreana com seus
missionários é muito superior ao cuidado recebido pelos missionários
brasileiros. É preciso humildade, paixão, seriedade, e desejo de fazer missões
de forma correta.
Sei que meu
clamor pouco impressionará alguns, irritará a outros, mas é apenas um clamor
escrito no sofá de casa, com minhas filhas aos pés, cada uma nascida em um país
diferente, são também filhas da missão, mas espero que possa despertar a paixão
e o pensamento de outros. Quanto a mim, continuarei na missão, venha o que
vier, continuarei a sonhar e trabalhar pela conversão do mundo, continuarei a
chorar quando ouvir Mateus 28:19-20 e ao ler histórias missionária como a de
Adoniram Judson que li mais uma vez hoje pela manhã. Até que todos tenham
ouvido.
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Fonte: O
Cuidado Integral de Missionários - Um forum para reflexão e encorajamento
http://cuidadointegral.info/
Via: www.sepal.org.br
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