VIDA MISSIONÁRIA
O LUGAR DO SOFRIMENTO NA VIDA DO MISSIONÁRIO
Autor: Antonia Leonora van der Meer
Ser missionário é um privilégio,
não um fardo intolerável carregado por uns “grandes servos de Deus”. Deus
escolhe os pequenos, os fracos, as coisas loucas deste mundo para que a glória
seja só dele (1 Co 1.26-29).
Mas esse privilégio está ligado ao caminho da renúncia
e de levar cada dia a sua cruz, seguindo a Jesus. O sofrimento já faz parte da
vida de muitos missionários e, quanto mais penetrarmos nas regiões ainda não
alcançadas, mais teremos contato com realidades de grande carência social e
espiritual, de conflito com poderes das trevas, de violência, guerra e
perseguição.
Isso leva ao sofrimento do missionário e de sua
família. Porém, muito mais do que isso, o confronto com o sofrimento do povo
certamente vai perturbar profundamente o coração do missionário.
COMO PODEMOS ENVIAR PESSOAS PARA LUGARES ONDE O
SOFRIMENTO É UMA REALIDADE DIÁRIA E MUITO FORTE?
Alguns acham que isso não pode ser a vontade de Deus.
Mas como foi que Deus enviou seu Filho? Com que garantia e segurança?
Lembremo-nos de que Jesus disse: “Assim como o Pai me
enviou, eu também vos envio” (Jo 20.21; 15.20). Isso significa correr os mesmos
riscos, vencer a mesma resistência, viver com a mesma expectativa de vitória,
por meio do caminho da cruz.
COMO PODEMOS DESCREVER O SOFRIMENTO NA VIDA DO
MISSIONÁRIO?
Nas horas de guerra violenta que presenciei, o que me
chocou mais profundamente foi ver pessoas feridas, caídas nas ruas sem ninguém
poder socorrer, e ouvir as histórias das vítimas da guerra nos hospitais. Uma
mulher sem braços que perdeu a única irmã, barbaramente violentada.
Crianças atingidas por balas enquanto dormiam em sua
própria cama. Ver a falta de recursos e a angústia dessas pessoas era
profundamente perturbador. Mas Deus precisa de um instrumento para levar sua
graça, amor e esperança a essas pessoas. É o sofrimento de saber da angústia de
nossa família e não poder fazer nada para tranqüilizá-la.
E as coisas sempre parecem piores do que são para quem
as acompanha de longe. É o sofrimento de acompanhar o despertamento espiritual,
a descoberta da graça de Deus por uma pessoa, que depois aparece mutilada,
morta pela própria família.
Outro motivo de sofrimento é que as pessoas põem em
nós uma carga de esperança de solução para seus problemas muito além das nossas
possibilidades.
Às vezes nos perguntamos: “O que estou fazendo aqui?
Fará alguma diferença esse pouco que posso fazer?” É claro que fará diferença!
Cada vida transformada, que recupera a esperança, a alegria e a razão de viver,
a consciência de sua dignidade é uma grande vitória. Mas às vezes ficamos
angustiados pelo muito que não
podemos fazer e que de nós é esperado.
Há também os sofrimentos relacionados com a família que deixamos para trás.
Muitos lutam e têm a obrigação de deixar pessoas e ministérios que amam para
dar apoio aos pais idosos que precisam de sua presença.
Outros sentem-se forçados a voltar prematuramente (o
coração ainda quer ficar) para não comprometer a educação e o futuro dos
filhos.
Além disso, há sofrimentos evitáveis, causados pela
irresponsabilidade dos que enviam sem apoio verdadeiro, sem orientação e sem
fidelidade no sustento financeiro. Isso gera profundas angústias e as igrejas
terão de prestar contas a Deus da maneira como tratam os seus obreiros.
QUAL É A NOSSA RESPONSABILIDADE?
Não podemos enviar missionários apenas invocando a
bênção de Deus e depois lavar as mãos. A obra é nossa, como igreja brasileira.
Precisamos estar bem perto de nossos missionários, acompanhando-os diariamente
em oração, mantendo contato por e-mail, carta, telefone, de modo responsável
(há lugares onde uma carta mal orientada pode causar muitos problemas).
Podemos enviar uma pessoa para visitá-los, orar com
eles e ouvi-los. Devemos recebê-los com muito carinho, cuidado e atenção quando
vêm de férias, para que tenham um bom descanso e renovação física, emocional e
espiritual, provendo suas necessidades. (Infelizmente, ainda há igrejas que
cortam o sustento durante os meses em que o missionário está no Brasil, pois
entendem erroneamente que ele “já não está fazendo o trabalho missionário”.)
Assim, há sofrimentos inerentes ao modelo de encarnação deixado por Cristo,
para os quais o missionário deve estar preparado. Outros tipos de sofrimento
podem ser minorados e é nossa responsabilidade fazê-lo, com carinho e amor
pelos que estão na linha de frente.
—–
Antonia Leonora van der Meer, mais conhecida por Tonica, foi missionária em
Angola por dez anos e, agora, é deã do Centro Evangélico de Missões, em Viçosa,
Minas Gerais.
Fonte:http://www.ultimato.com.br/revistas_artigo.asp?edicao=274&sec_id=156
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