O PAI DAS MISSÕES MODERNAS
O INCOMPARÁVEL LEGADO DE
WILLIAM CAREY
Por Rubens Muzio
Na introdução ao livro The Legacy of
William Carey (O legado de William Carey), o conhecido teólogo indiano Vishal
Mangalwadi demonstra como esse famoso missionário inglês, pastor batista e pai
das missões modernas foi mais do que simplesmente um típico missionário
transcultural.
Na verdade, ele foi um modelo de
líder cristão preocupado com a transformação das culturas, das castas e das
cosmovisões da Índia. Para que o leitor tenha uma idéia de sua abrangência e
influência, se alguém fizesse a seguinte pergunta nas universidades indianas:
“Quem foi William Carey?”, aconteceria mais ou menos o seguinte.
LETRAS, LITERATURA E EDUCAÇÃO
Estudantes dos departamentos de
letras, literatura e educação o reconhecem como o primeiro tradutor dos grandes
clássicos religiosos da literatura indiana, como, por exemplo, o Ramayana e o
tratado filosófico Samkhya na língua inglesa.
Willian Carey traduziu e publicou a
Bíblia em quarenta idiomas diferentes. Ele fundou a primeira faculdade asiática
em Serampore, perto de Calcutá.
Foi professor de bengali, sânscrito e
marathi no Fort William College, em Calcutá, e escreveu o primeiro dicionário
de sânscrito para estudiosos.
Além disso, começou dezenas de
escolas para crianças de todas as castas. Por mais de três mil anos, a cultura religiosa
proibiu a maioria dos indianos de ter acesso ao conhecimento, estratégia das
altas castas para controlar as castas inferiores.
Carey demonstrou tremendo poder
espiritual contra os sacerdotes e religiosos. Escreveu “Baladas do evangelho”
em bengali para atrair os adeptos dos cultos hindus, que amavam a música, e
transformou o bengali — considerada apta somente para mulheres e demônios — na
língua mais importante da Índia. Seu objetivo sempre foi criar uma literatura
vernácula, nacional.
HISTÓRIA
Estudantes de história o têm como pai
da renascença indiana nos séculos 19 e 20. O ápice intelectual, artístico,
arquitetônico e literário da Índia hindu do século 11 cessou e declinou com o
monismo de Adi Shankaracharya. Todo o racionalismo, modernismo, temas
científicos e tudo o mais que enriquece a cultura se tornou suspeito dentro da
cultura.
Asceticismo, misticismo, ocultismo,
superstição, idolatria e feitiçaria formaram a estrutura e a visão de mundo da
cultura indiana. Isso tudo em meio à exploração estrangeira e controle europeu.
Carey viu a Índia como um país amado
por Deus, onde a verdade deveria reinar. O movimento de Carey culminou no
surgimento do nacionalismo indiano e subseqüente movimento pela independência.
ECONOMIA
Estudantes de economia o apontam como
o precursor da idéia da poupança, um homem que lutou contra a avareza, a
cultura de propinas e a usura da época. “Juros entre 36% e 72% tornam
investimentos, indústria e comércio impossíveis”, dizia ele! Carey pregou ética
na economia e buscou incrementar as relações econômicas entre a Índia e a
Inglaterra numa época de xenofobia.
ENGENHARIA
Estudantes de engenharia o tratam
como um industrial, que trouxe a máquina a vapor para a Índia, animou os
ferreiros a fazerem cópias de suas máquinas. Foi o primeiro a utilizar papel
indiano para publicação.
ECOLOGIA
Estudantes de ecologia garantem que
Carrey foi o primeiro a escrever artigos sobre a floresta indiana quase
cinqüenta anos antes de o governo começar suas tentativas de conservação
ambiental em Malabar. Carey defendeu o cultivo da madeira dando conselhos
práticos sobre a agricultura e sobre como plantar árvores com propósitos
ambientais e comerciais.
“Deus nos fez responsáveis por toda a
terra”, dizia ele.
AGRONOMIA
Estudantes de agronomia o tratam como
o fundador da Sociedade Agricultura e Horticultura, em 1820, trinta anos antes
de a Sociedade Real de Agricultura ser estabelecida na Inglaterra. Carrey fez
sistemáticas pesquisas da agricultura e intensas campanhas pela reforma
agrária. Tudo isso por estar horrorizado pelo fato de três quintos da Índia se
tornarem uma grande selva não cultivada e cheia de feras e serpentes. Carey
publicou os primeiros livros sobre ciência e história natural na Índia, trouxe
o sistema de jardinagem Linnaen e inspirou o nome de um dos três eucaliptos do
país: Careya Herbacea. Freqüentemente, palestrou sobre ciência e mostrou como
os insetos não seriam almas aprisionadas, mas criaturas valiosas na cadeia
alimentar.
MEDICINA
Estudantes de medicina lembram que
Carey realizou a primeira campanha em favor de um tratamento digno aos
leprosos. Naquela época, eles eram queimados ou enterrados vivos pela crença de
que um corpo, com um fim violento, transmigraria para uma existência saudável.
“Jesus tocou os leprosos”, dizia Carey.
COMUNICAÇÃO
Estudantes de comunicação e marketing
o honram como o pai da tecnologia da impressão. Ele trouxe a imprensa e a
publicação e ensinou a utilizá-las. Foi ele quem estabeleceu o primeiro jornal
em língua oriental, o Friend of India, uma força que impulsionou o movimento de
reforma social na primeira metade do século 19.
SOCIOLOGIA
Estudantes de sociologia e dos
direitos da mulher lembram que ele fez pesquisas sociológicas e publicou
artigos para levantar protestos em Bengala e Inglaterra. Foi o primeiro a
levantar-se contra os assassinos cruéis e opressores da mulher indiana. Os
homens destruíam as mulheres por meio da poligamia, genocídio e casamento
infantis, queima de viúvas (sati), eutanásia e analfabetismo feminino. Todos
esses atos eram sancionados pelo hinduísmo e outras religiões. Carey persistiu
em sua luta contra o sati durante 25 anos, até que o edito de 1829 baniu essa
prática. Abriu escolas para moças e arranjou maridos para viúvas convertidas.
FILOSOFIA
Estudantes de filosofia asseveram que
William Carey reviveu a antiga idéia de que ética e moralidade estão
inseparavelmente ligadas à religião, enquanto muitos na época separavam a
espiritualidade da moralidade. Ele reafirmou que os seres humanos são pecadores
e precisam de perdão. Esse ensino revolucionou a espiritualidade indiana, que
enfatizava meramente a experiência mística individualista.
ASTRONOMIA
Estudantes de astronomia sabem que
Carey introduziu o estudo da astronomia na Índia. Ele não acreditava que os
astros eram deuses que governavam a vida das pessoas. Profundamente preocupado
com os desdobramentos culturais da astrologia (fanatismo e superstição), ele
lembrou que os homens foram criados para governar a natureza e não vice-versa.
Sabia que o sol, a lua e os planetas são criados para manifestar a glória de
Deus e ajudam a dividir as estações, anos e meses e a definir direções (norte,
sul, leste, oeste). A astronomia liberta, enquanto a astrologia aprisiona!
BIBLIOTECONOMIA
Estudantes de biblioteconomia o
aceitam como o pioneiro no empréstimo de bibliotecas para a Ásia. Enquanto os
navios britânicos importavam armas e soldados, Carey trouxe livros educativos e
sementes nesses mesmos navios.
“Livros libertam”, dizia Carrey!
O EVANGELHO INTEGRAL
Como você pode perceber, William
Carey desejava que o evangelho de Cristo influenciasse todas as áreas do
conhecimento e penetrasse em todas as esferas sociais. Carey possuía uma
profunda convicção de que o reino de Deus deve causar impacto e transformar os
valores, as ciências, as idéias, as atitudes e a mentalidade do povo.
Como cristãos, não podemos apenas
“salvar almas”, abençoar pessoas espiritualmente (se bem que “espiritualmente”
não significa “fora do corpo”, alma etérea, mas, sim, uma ação do Espírito de
Deus sobre a vida).
Parece que esta, ainda, é a tendência
vigente em muitas igrejas e projetos cristãos: fiquemos com nossas igrejas
ambientadas, cultos modernizados e programas contemporâneos! E o mundo lá fora?
Essa escatologia escapista ou teologia fatalista nunca marcou a visão de
William Carey e de muitos outros santos e sábios missionários, encorajados pelo
evangelho integral do Senhor Jesus Cristo, bem como do seu irmão Tiago e do
apóstolo Paulo de Tarso.
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Rubens Muzio Mestre em teologia
pastoral pelo Calvin Theological Seminary e doutor em teologia pastoral pelo
Westminster Theological Seminary.
Fonte: Instituto Cristão de Pesquisas
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