COMO ELABORAR UM CURRÍCULO DE MISSÕES

 


Pb. Valmir Barbosa

        Ao contrário do que acontecia até o final da primeira metade do século vinte, a partir da segunda metade até o início do atual, vimos um aumento significativo de iniciativas voltadas para ensino missiológico no Brasil. Este movimento crescente de missões, era até louvável, o entusiasmo  e a euforia que tomava conta de nossas igrejas brasileiras, na realização de Conferências Missionárias, Congressos, Seminários e Simpósios Missionários e nesse clima de animação e o desejo de acelerar o cumprimento da Grande Comissão, surgia de modo bastante animador os Centros de Treinamentos Missionários.

Este fenômeno era bastante desejável, entretanto, não percebemos que no bojo dessa euforia, alguns Seminários e Centros de Treinamentos estavam utilizando e ainda hoje, algumas instituições utilizam currículos preparados por “professores” teóricos, completamente alienados da realidade missionária, e que embora sejam bem intencionados, não tem nenhuma experiência do que acontece no campo missionário.

Tais currículos, muitas vezes adaptados de outras realidades culturais, não levam em conta as necessidades do trabalho que nossos obreiros realizarão no campo aos quais serão enviados. Ora, se sabemos que um dos fatores que contribuem para o aumento do retorno prematuro dos nossos missionários é a falta de um preparo adequado para enfrentar e superar os desafios do campo transcultural, estamos passando da hora de tomarmos uma posição que venha atender às necessidades dos nossos vocacionados que estão sendo preparados para a difícil tarefa de levar as boas novas do evangelho a outras culturas e alcançar povos que ainda não tiveram a oportunidade de ouvi-lo.

CARACTERÍSTICA DE NOSSOS CURRÍCULOS

Entendemos que um currículo ideal precisa ser flexível e à medida que vamos percebendo o surgimento de novos desafios, possamos adaptá-lo de forma a atender às novas realidades missionárias.

Ao observarmos o trabalho desenvolvido pelos missionários brasileiros no mundo, constataremos que nada fica a desejar, apesar das dificuldades características da nossa realidade. Mas não podemos ignorar que, um número significativo de missionários, não conseguem alcançar os objetivos estabelecidos isto, infelizmente, tem contribuído para aumentar a quantidade de trabalhadores que voltam do campo missionário prematuramente e muitas vezes frustrados ou cheios de dúvidas quanto ao seu chamado.

Estudos e pesquisas têm sido realizados por estudiosos da área missiologicas, em colaboração com lideranças missionárias em vários países diferentes, chegou-se à conclusão que a média anual de abandono do campo missionário é de 5 % da força missionária. Quanto ao Brasil, o índice  referente  é de 8,5 %, 70 % maior que a média geral.  Embora estes dados sejam preocupantes, não podemos ignorar que, muitos outros fatores contribuem para a constatação destes números.

        Ao analisarmos este assunto e vermos que um dos fatores que contribuem para o preocupante fato de que muitos missionários voltam prematuramente do campo missionário. Pensamos em sugerir que uma boa reforma curricular voltada para a nossa realidade, poderia perfeitamente melhorar o nosso ensino missiológico e minimizar este problema, pois sabemos que a maioria das razões de abandono do campo é evitável. E, muitas deles podem ser resolvidos através de um preparo mais adequado.

        O motivo de estarmos falando sobre este assunto, talvez sirva para buscarmos melhor aproveitamento do nosso ensino missiológico e refletir sobre o conteúdo  curricular dos cursos missiológico, em relação ao contexto cultural e religioso em que vivemos.

É histórico em nosso contexto cultural, apresentarmos uma rejeição, a que chamamos de “aversão a enlatados", que muitas vezes são importados de outros contextos culturais. O essencial e mais importante não é a forma curricular, mas o conteúdo transmitido aos nossos candidatos, isto sim, é de vital importância.

    É nossa responsabilidade portanto, analisar, dentro das limitações de espaço, de tempo e do alcance do assunto, buscando estes princípios e questionando de forma positiva, os aspectos nos quais podemos melhorar. Para tanto, partiremos da literatura disponível sobre o assunto e da experiência pessoal de cada docente.

        E claro que, “Quando não se pode fazer tudo que se deve. Deve-se fazer tudo que se pode”. Se nem tudo é como desejamos, devemos encarar a realidade como um desafio. Esta é uma oportunidade para buscarmos a perfeição. O fato de sabermos que nunca alcançaremos a perfeição aqui não pode ser uma desculpa para não tentarmos.

      Falamos no início do texto que o número dos cursos de missões vem aumentando. Existe uma constante demanda de treinamento e grande parte das agências missionárias  ou grejas,possuem o seu próprio curso. Os níveis variam desde um curso básico elementar de conhecimentos gerais sobre missões, até o nível de mestrado.

A variação em termos de teoria versus prática também é grande, sendo que o treinamento específico dado pelas agências e algumas igrejas para os seus futuros missionários deveriam ser mais práticos do que os cursos oferecidos por seminários e centros acadêmicos.

        Não podemos deixar de  considerar e refletir sobre o perfil do candidato a missões dentro do contexto brasileiro, isto pode ser arriscado. Somos um país com dimensões continentais que engloba os possíveis contextos sociais, religiosos, culturais, raciais e eclesiásticos. Há uma variedade enorme em  nossa força missionária e esta é uma das nossas riquezas.

Uma vantagem existente em nossos enviados para as mais diferentes culturas do mundo, é a semelhança entre o nosso povo e os povos aos quais muitas vezes, se misturam sem parecerem diferentes. Quando reunimos nossos candidatos nos cursos (algumas vezes pessoas vindas das diferentes regiões brasileiras), notamos a variedade e só o fato de ficarem juntos algum tempo já é um excelente treinamento cultural.

     Para facilitar a reformulação curricular, precisamos partir de algum tipo de generalização. Certamente, surgirão algumas injustiças, cometidas na adoção de um procedimento como este, porém é a única forma de relacionar o conteúdo de um curso com a pessoa do aluno.

        No preparo dos nossos candidatos ao campo missionário, não podemos ignorar a necessita de equilibrarmos a teoria com a prática. Como e quando os diferentes aspectos são abordados e adquiridos e em que ordem, não tem muita importância. Algum tipo de simultaneidade entre o estudo teórico e a aplicação prática pode ser recomendada, isso não significa uma obrigatoriedade necessária.

           FORMAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM

         É importante lembrar que todo o ensino e aprendizado humano deve ser classificado em três abordagens básicas: ensino formal, ensino não-formal e informal.

1. ENSINO FORMAL

         Entendemos por ensino formal aquele que é dado na sala de aula. Trata-se primordialmente de palestras onde o conteúdo cognitivo é transmitido. Geralmente cria-se uma situação de professor - aluno onde o primeiro fala e o segundo ouve.

        Portanto, o ensino formal, que tem a sua indiscutível importância num currículo missiológico, pode ser constantemente melhorado à medida que as aulas tornam-se oportunidades para descobertas conjuntas de professor e alunos. Ainda mais dentro de uma área onde a contribuição de cada um representa uma vinculação cultural do assunto.

        O objetivo, naturalmente, é de formar missionários que conseguem resolver os problemas através de uma análise própria, respeitando as diferentes facetas de uma situação. O treinamento para tal capacidade deve ocorrer já na sala de aula.

2. O ENSINO NÃO-FORMAL

        O ensino não-formal é aquele que segue um plano determinado, curricular, mas não ocorre necessariamente dentro da sala de aula. Pode ser seminários, pesquisas, discussões, trabalhos em grupo, etc., onde o aluno aprende a desenvolver sua capacidade criativa e reflexiva.

        A importância dos pequenos grupos para desenvolver esta parte do ensino é claramente evidenciada. Proporciona, além do conhecimento, uma oportunidade de treinar o trabalho em equipe e de relacionar-se com outras pessoas dentro de uma tarefa comum.

        As viagens de estágio para um campo missionário podem muito bem entrar no planejamento do ensino não-formal. São excelentes oportunidades para conhecer os candidatos.

3. O ENSINO INFORMAL

        O processo educativo completa-se ao incluir também o ensino informal, o da convivência diária entre professor e aluno e entre os alunos. Vida comunitária, treinamento em discipulado, vida familiar, aconselhamento pessoal, habilidades de liderança, avaliações pessoais, etc., fazem parte deste lado do ensino.

        Reconhecemos que o ensino informal exige mais do professor. A convivência e o discipulado requerem mais tempo e comunhão mais intensiva. Muitas vezes, nossas instituições não proporcionam esta facilidade segregando o professor e o aluno de um convívio fora de aula. Nos cursos de curto prazo a possibilidade de convivência é bem maior, mesmo sendo por um período mais limitado.

        O caráter do candidato pode ser fortemente trabalhado dentro do ensino informal. Sendo um dos aspectos mais importantes para a formação do obreiro, decisivo para o êxito no trabalho e vital para a manutenção do missionário no campo.

Da mesma forma que buscamos professores competentes para o ensino formal, convidamos palestrantes e especialistas para uma interação não-formal em seminários e discussões ou para orientação de pesquisas, também necessitamos de pessoas devidamente preparadas para trabalhar o lado informal. Isto se consegue com simples camaradagem e visão pastoral, mas no tratamento de áreas especificas, é necessário profissionais ou pessoas treinadas para isto. Se não buscarmos profissionalismo naquilo que fazemos, estaremos formando bons amadores para o campo missionário! 

        É, portanto, na complementação destes elementos de ensino que o futuro missionário poderá ser treinado de forma adequada para sua tarefa. Também é bom lembrar que da mesma forma como nossos candidatos são treinados eles irão, provavelmente, treinar outros nos campos missionários onde estarão.

-------------------------------------------

Pb. Valmir Barbosa


Comentários

POSTAGEM MAIS VISITADA

APRENDIZAGEM DE LÍNGUA

ESQUECERAM DE MIM...

ANTROPOLOGIA CULTURAL