IMPLICAÇÕES EMOCIONAIS NA CARREIRA MISSIONÁRIA - PARTE 2
SITUAÇÕES
QUE CAUSAM SOBRECARGA
EMOCIONAL NO CAMPO MISSIONÁRIO
CHEGADA
AO CAMPO
Além
das implicações culturais e lingüísticas a chegada de um missionário no campo é
sempre cercada de enormes demandas logísticas e o resultado é um clima de
tensão. Os primeiros meses após o desembarque representam um período em que
todo obreiro precisa ter em mãos uma boa reserva financeira.
Quando
isso não é uma realidade, somente uma genuína confiança na provisão
sobrenatural de Deus será capaz de evitar um quadro de preocupações. No mínimo,
o obreiro precisará de recursos para quitar despesas imediatas com o aluguel de
uma casa e com a compra de mobília básica.
Há
ainda outras ocasiões em que haverá a necessidade de assumir despesas com
hospedagem numa moradia temporária, com a aplicação de visto (quando o processo
de aplicação de visto ocorre no país onde se deseja estabelecer residência),
com a tradução de documentos, com a matricula dos filhos em uma escola, com o
aprendizado da nova língua – seja o aprendizado formal, numa escola, ou
informal, com o auxilio de um nacional – é com a compra de acessórios que possibilitam
a adaptação imediata ao novo ambiente (casaco, toca, luva, turbante, véu,
etc.).
Sem falar na compra de um carro, moto, barco ou camelo, dependendo em
que região da terra o missionário esteja. Em alguns contextos, o transporte
particular está longe de representar um objeto de luxo, antes, é a única forma
de acesso ao povo que se deseja alcançar. O conjunto de todas essas demandas
pode produzir um estado de cansaço físico e emocional.
SUSTENTO
INADEQUADO
Outras
situações como sustento inadequado também estão entre os fatores que podem
abalar bastante o obreiro emocionalmente.
Lidar
com problemas financeiros estando fora do país e distante da família, da
comunidade crises de origem e dos amigos exigirá de qualquer individuo uma boa
dose de maturidade.
Essa
situação pode se tornar ainda mais desafiadora quando o missionário, além de
depender de recursos para sustentar a família, é responsável por outras
despesas no desenvolvimento do ministério.
Lamentavelmente,
o sustento inadequado dos missionários brasileiros tem produzido situações
extremamente desconfortáveis nos campos e sugerido, em contraste com o que afirmam as Escrituras, que o obreiro
não é digno do seu salário (1 Timóteo 3.18).
Observando
nossa caminhada como movimento missionário brasileiro, somos desafiados a
reconhecer que ao longo dos anos o problema da falta de sustento tem tornado o
campo missionário numa arena de fé e em alguns casos num terreno de
sobrevivência para o missionário brasileiro.
ALUGUEL
DE CASA
O
processo de aluguel de uma casa pode roubar muitas energias de um missionário.
Em países como a Tailândia, não é comum encontrar imobiliárias e é preciso
visitar a comunidade em cada bairro para descobrir a disponibilidade de casas
para alugar.
Já
em países como a Indonésia, o inquilino é obrigado a providenciar o pagamento
adiantado do aluguel que pode variar de três meses a um ano, antes de se entrar
para morar na casa.
Na
África do Sul, é exigido o pagamento de um depósito equivalente a dois ou três
meses do valor do aluguel como garantia por danos ao imóvel. O que supostamente
deve ser devolvido ao inquilino no fim do contrato.
A
experiência de alugar uma casa pode se tornar ainda mais penosa em se tratando
de um missionário que acaba de desembarcar no campo.
Além
do desgaste natural dessa empreitada, depois de algumas semanas vivendo
provisoriamente, acrescenta-se o esgotamento com o processo de mudança e com a
falta de privacidade, sobretudo se o missionário possui esposa e filhos.
SAUDADE
Nos
primeiros meses e anos, a saudade da família e dos amigos afeta
consideravelmente as emoções do recém chegado, em especial se ele faz parte de
uma sociedade que estima viver em comunidade e que considera os relacionamentos
em alto nível. Nessa fase, aliado à saudade, o receio de ser esquecido ou
abandonado pela igreja enfiadura também pode abater um obreiro e representar um
desafio maior do que as lutas enfrentadas no campo.
AUSÊNCIA
DE RESULTADOS
A
ausência de resultados satisfatórios no ministério também pode causar
considerável estresse. Quando não é perceptível o avanço no aprendizado da
língua ou quando o povo alvo resiste ao evangelho, mesmo depois de já ter
ouvido a pregação por longos meses, é comum que surja o sentimento de
abatimento. Invariavelmente, as expectativas não correspondidas se transformam
em objeto de frustração.
DOENÇAS
As
doenças, além de debilitarem o corpo, sempre acabam por produzir um conjunto de
preocupações que, por sua vez, geram tensão emocional...
PERDAS
DE COLEGAS NO CAMPO
No
campo missionário os relacionamentos tendem a acontecer numa maior aproximação
e a perda de companheiros de trabalho. “Mesmo sabendo que Deus está no controle
de todas as situações”, este contexto, pode representar uma das experiências
mais traumáticas na carreira missionária.
PERDAS
FAMILIARES
Se
as perdas familiares nos abalam quando ocorrem no convívio da família, imagine
a condição emocional de alguém que passa por esse tipo de experiência estando
distante, às vezes, em outro país ou continente. Além do abalo causado pela
notícia, pela dor imensa da perda e pela saudade de alguém que não será mais
visto na terra, o sentimento de incapacidade diante dos fatos é presente.
Perder
um ente querido estando longe de casa será sempre uma experiência cercada de
muita tensão e suas conseqüências podem se estender por mais tempo do que o
normal.
RETORNO
DO CAMPO
O
retorno do campo e a readaptação ao ambiente cultural de origem fazem parte de
um processo que pode representar a fase mais difícil na carreira missionária.
As dificuldades para se reajustar a vida e se adaptar ao novo contexto têm sido
classificadas como choque cultural reverso.
Todo
processo de adaptação já é um desafio em si e a situação pode ser agravada
quando o missionário e seus filhos retornam do campo estando desinformados,
desatualizados e se sentindo totalmente fora da realidade em seu contexto de
origem.
DESCANSO
PARA AS EMOÇÕES
O
que fazer diante de um cenário emocional desafiador? Para onde ir? Onde
encontrar abrigo? Voltar-nos para as Escrituras é refúgio garantido em
situações de crise!
Além
de encontrarmos palavras de vida (conforto seguro para a alma), é lá, nas
Escrituras, que nos identificamos com gente como nós. Isso mesmo! Embora sejam
homens e mulheres gigantes na fé, eles expõem suas fragilidades sem qualquer
timidez e se demonstram pequenos do nosso tamanho.
O
apóstolo Paulo, por exemplo, comenta acerca de um momento de tribulação sofrido
no campo que o fez se sentir em grande desespero e, até mesmo sem esperança de
viver. Paulo? Sim, o apóstolo, o missionário, o irmão Paulo. Esse comportamento
tem alguma relação com sua experiência? Consegue enxergar? Que bom! Você não
está sozinho!
“Irmãos, não queremos
que vocês desconheçam as tribulações que sofremos na província da Asia, as
quais foram muito além da nossa capacidade de suportar, a ponto de perdermos a
esperança da própria vida” (2 Coríntios 1.8).
Há,
ainda, outras atitudes que devemos assumir, a fim de lidarmos com as constantes
crises e evitarmos conseqüências danosas à nossa saúde. Entre elas, devemos
observar os fatores que alteram as nossas emoções e aprender a lidar com eles
ou se possível, evitá-los.
Diante
de decisões práticas que devem ser tomadas é importante que se evite
precipitações, que se desenvolva paciência e que se procure fazer escolhas que
no futuro não serão objetos de remorso.
Em
se tratando do aluguel de uma residência, por exemplo, é recomendável que na
chegada ao campo o primeiro contrato ou compromisso de aluguel seja assumido
por um período curto de tempo. Sugiro que no máximo por oito meses.
Permanecer
por um período curto na primeira residência, além de nos ajudar a avaliar
melhor a condição física do imóvel será importante para estudarmos se a
localidade é estratégica para o desenvolvimento do ministério e se o preço
apresentado pelo proprietário ou pela agência reflete a realidade do mercado
imobiliário local.
É
importante considerar que as decisões tomadas no inicio da jornada refletirão
ao longo de todo o ministério, sejam elas positivas ou negativas. Portanto,
assumir compromissos curtos (mesmo que
seja para lecionar em uma escola bíblica) e renová-los de tempo em tempo parece
ser a atitude mais prudente. Uma vez que quando nos comprometemos em longo
prazo, podemos ficar presos a determinada situação, por conta de uma decisão
precipitada.
Será sempre mais fácil dizer: “Meu compromisso está encerrado!”,
do que: “Pensando bem, cheguei à conclusão de que não será possível cumprir com
o que havia prometido”.
Ser
realista diante de nossas limitações, procurar desenvolver atividades de
pastoreio mútuo com os colegas no campo e receber acompanhamento de um
profissional de saúde (se essa possibilidade é real) é também atitudes
recomendáveis.
O
contraponto é que boa parcela dos missionários deixam para cuidar da saúde e
pensar mais em si do que no trabalho somente quando retorna ao seu país por um
período de férias. Contudo, esse tipo de postura precisa ser revista, caso o
nosso alvo seja permanecer na carreira missionária por longa jornada.
VALIOSA
INTERVENÇÃO
Terminantemente,
a assistência do Corpo de Cristo exercerá importante influência nas situações
de estresse e desencorajamento.
Uma
interferência de nossa igreja e das igrejas parceiras será sempre bem-vinda e
poderá fazer toda a diferença num cenário de lutas. Há estágios de sobrecarga
emocional que somente são superados com o auxílio de ajuda externa.
O
recebimento de um telefonema ou carta pode ser precioso instrumento nas mãos de
Deus para encher de alegria e renovar a esperança ou coração do missionário e
sua família. Sem dúvidas, isto é uma verdadeira demonstração de amor e parceria
missionária.
Imagine,
agora, a seguinte cena: o missionário e sua família estão descansando na
esteira após um dia de trabalho extremamente estressante. O telefone toca. Pela
demora em completar a chamada, percebe-se que se trata de uma ligação
internacional. Quem será? Um clima de expectativa se instala.
Finalmente a
ligação é completada. É o pastor do missionário, que, depois de um período de
oração, entende que, além dos contatos periódicos, a família missionária estava
precisando ser ouvida. “E aí, meus irmãos, como vão as coisas?”. A conversa
pastoral se estende por alguns minutos e, depois de exercitar a arte de ouvir,
o compromisso de oração pelo missionário e por sua família é renovado. O
telefone volta ao gancho e a família a esteira. Agora, a alegria é grande no
coração de todos e a noite se tornou uma perfeita ocasião para desfrutarem de
um sono reparador.
Autoria: Missionário Jairo de
Oliveira.
Extraído
do livro Vida, ministério e desafios no campo missionário, uma abordagem
contemporânea sobre missões. Da editora Abba. 2011.
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