MISSIONÁRIO - SER OU NÃO SER
10 MOTIVOS PARA NÃO SE TORNAR UM MISSIONÁRIO
“Por favor não mimem nem superprotejam nossos missionários, dizendo
a eles que devem cuidar-se ou deixar de se cuidar”, disse um líder
de uma agência do Sul global, que participou conosco de um encontro
internacional de Cuidado do Missionário. Depois um representante de outro país
se manifestou: “Muitos missionários são muito delicados e não entendem que o
sofrimento é parte da vida missionária. O que precisamos é somente depender de
Deus. O sofrimento santo é parte da vida missionária”.
A psicologia há muito tempo reconheceu que as
famílias missionárias, ou aqueles que fazem trabalho humanitário em países
estrangeiros, estão expostos a níveis altos de estresse devido à natureza de
seu trabalho. O fato de se terem deslocado de forma voluntária para viver em um
país que não é o seu, de se terem forçado a aprender um novo idioma e costumes,
de terem deixado sua rede social de apoio e de terem como trabalho uma
constante atenção a outras pessoas em necessidade coloca os missionários em
risco de desenvolver uma fadiga ministerial, caso não desenvolvam uma
disciplina de autocuidado.
Na comunidade cristã, a questão do autocuidado na vida do missionário
era vista como uma atitude “egoísta” ou como um sinal de “falta de fé”. Historicamente,
as primeiras famílias missionárias deixaram seus países com a absoluta
confiança que o Deus da missão cuidaria delas em tudo e que nada lhes faltaria
(Salmo 23). Deus era percebido como o único que cuidava do missionário.
Posteriormente, na época moderna, as agências
missionárias assumiram uma leitura interdisciplinar sobre a vida missionária e
o exercício do cuidado do missionário de forma integral. No final se concluiu
que muitos casos de retorno prematuro poderiam ter sido evitados se tivesse sido
dedicado um cuidado ao missionário de forma mais proativa e por “todos” que participam desta empresa divina e humana.
Na
atualidade, como bem disseram diversos missionários com especialidade em saúde
mental, como é o caso de Kelly O’Donnell, o cuidado do missionário é
responsabilidade não só de Deus como também do próprio missionário, da equipe,
de quem envia, dos especialistas (quando for necessário) e das redes que
oferecem estes serviços de cuidado.
Esta
evolução ou maturidade no conceito de cuidado do missionário, que agora é mais
interdisciplinar e integral, não se limita a descansar no cuidado de Deus.
Nesta nova época, quem serve em missões assume uma atitude individual e
interdependente, sendo mais proativo, preventivo e responsável ao cuidar de sua
espiritualidade, sua mente, seu corpo e suas relações, sem que sinta que será
criticado como fraco de fé, emocionalmente imaturo ou até egoísta.
A TENSÃO
O exemplo dado no início mostra dois paradigmas
que, levados ao extremo, poderiam ser um erro:
1)
Espiritualizar a necessidade do cuidado do missionário, confiando que Deus é o
único responsável por cuidar e minimizando a responsabilidade do missionário
nesta tarefa; ou
2)
Dar uma ênfase excessiva à Psicologia e exagerar a responsabilidade do
missionário em cuidar de si mesmo com recursos humanos.
Alguns
missionários manifestam este dilema ou tensão dizendo: “Confiamos na graça de
Deus e em seu cuidado ou confiamos nas ciências e no cuidado de outros seres
humanos, tão falidos como nós”.
Um dos conflitos na cultura evangélica
latino-americana poderia estar relacionado à terminologia. Por exemplo, a
palavra “autocuidado” é percebida muitas vezes como uma atitude humana e
egoísta, oposta ao papel natural do missionário, que está associado a humildade
e sacrifício.
Ainda
mais na região andina, onde abraçar a dor e o sofrimento é expressado na
música, quando, em seu lamento, a mulher ou o homem aceita e se alegra em sua
pena. Logicamente, neste contexto o termo “cuidado de Deus ao missionário” é
percebido de forma mais positiva que o cuidado de si mesmo.
A realidade é que o cuidado do missionário tem
duas expressões, a que vem de cima e a que vem de baixo. O cuidado de Deus ao
missionário é a expressão que ocorre a partir de cima, é sobrenatural, é
perfeita, porque provém do onisciente e soberano Deus da missão.
O
cuidado do missionário que se realiza por si próprio, de forma responsável, ao
tratar de sua saúde espiritual, física e emocional com o objetivo de evitar ser
anulado pelo alto nível de estresse, é um cuidado que vem de baixo. Este
cuidado que vem de baixo é compartilhado entre o missionário, os que são
membros da mesma equipe missionária, os dirigentes da equipe, a igreja
enviadora, organizações missionárias receptoras e outros recursos humanos, como
especialistas em saúde mental, pessoal e familiar dos missionários.
RECOMENDAÇÕES
A chave está em evitar superproteger ou
desproteger o missionário e sua família. Na sequência, enumerei algumas áreas
que o missionário precisa levar em conta em seu “autocuidado”. Ao mesmo tempo,
também os que exercem o ministério de Cuidado do Missionário poderiam
recordar-se destas considerações, entre outras:
§ Evitar cair na atitude de crer que se tem que
desenvolver projetos grandiosos e irreais.
§ Desenvolver um plano de longo prazo com papéis e
atividades específicos e realistas.
§ Identificar e manter uma proposta de crescimento
espiritual, relacional, ministerial etc.
§ Exercitar-se em disciplinas que promovam o
bem-estar e a saúde espiritual, física e emocional.
§ Manter regularmente reuniões individuais com
mentores, supervisores e outros espaços seguros, onde se possam ventilar
emoções conflitivas ou reprimidas.
§ Esforçar-se para manter um bom equilíbrio entre
passar o tempo com a família e o ministério é importante para o casal, para que
cada um seja consciente de promover o bem-estar integral de seu cônjuge.
§ Manter um equilíbrio saudável entre dar e receber.
O missionário ou missionária não é uma pessoa superpoderosa ou auto-suficiente,
que nunca precisa de ajuda. Deve reconhecer seus limites e alegrar-se com os
recursos que Deus lhe dá para se cuidar.
§ Ser consciente dos fatores internos e externos que
perpetuam o alto nível de estresse.
§ Desenvolver a capacidade de perdoar e de se perdoar, como também de saber resolver ou enfrentar os problemas cotidianos de forma saudável.
Lembre-se
que nosso Senhor Jesus nos deixou o modelo de passar tempo a sós com o Pai.
Este tempo, na presença do Pai, é essencial para renovar a fé, nutrir o
chamado, fortalecer o sentido e o significado de ser parte da força missionária
que Deus está usando neste tempo, assim como a dependência constante de Deus,
perguntando a Ele: e agora, Senhor, que desejas que eu faça sob tua direção e
companhia? Isso nos ajudará a entender que as forças e a direção proveem da
soberania e da graça de Deus. Ele fará o cuidado vindo de cima e nos convidará
a usar o cuidado que vem de baixo.
O
cuidado do missionário é uma necessidade e responsabilidade imperativa. Não
assumamos que, por sermos latino-americanos, estamos mais acostumados a tolerar
ambientes difíceis ou hostis por termos vivido conjunturas políticas,
econômicas e sociais com um alto nível de conflitos.
Dr. Carlos Pinto
Psicólogo
clínico e familiar
Diretor associado de Cuidado Integral, COMIBAM
Internacional.
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