ANTES DE CHEGAR AO CAMPO MISSIONÁRIO - PARTE 1



BEFORE GETTING TO THE MISSION FIELD

Me. João Ricardo Morais

Este artigo tem por objetivo destacar a importância da fase pré-campo na vida do missionário. Desde o seu chamado até o momento de sua chegada ao campo missionário, existem etapas a serem cumpridas e responsabilidades a serem partilhadas.

O treinamento adequado, propiciando ao missionário a possibilidade de executar seu trabalho com muito mais eficiência e eficácia, o levantamento de sustento apropriado também é abordado, devido à sua relevância.

Por último, mas não menos importante, tanto o momento do envio quanto o compromisso firmado pela igreja local (enviadora) e os resultados desta demonstram a importância dessa fase que antecede à chegada ao campo e as consequências dela na vida do futuro missionário.

É totalmente genuína a preocupação com aquilo que os missionários devem saber antes de chegar aonde Deus os enviou como Seus embaixadores. Por esta razão é que tantos se dedicam a instruí-los, treiná-los e prepará-los para essa maravilhosa e divina empreitada.

Contudo, a decisão de elaborar uma grade adequada de assuntos a serem abordados durante a fase preliminar para a formação do missionário ainda é motivo de debate. O que é realmente relevante durante a fase de preparo deve ser levado em consideração de forma exaustiva. Tudo pode até começar com a chamada missionária, mas não termina nela.

Muitas vezes o caminho é longo até que se dê a chegada ao campo missionário. O treinamento formal e informal, proporcionando ao candidato um conhecimento prévio, mesmo que limitado, daquilo que supostamente encontrará no campo é de grande valor e imprescindível. A necessidade do bom preparo é uma realidade, pois há muitos missionários que estão servindo em campos transculturais que levaram entre 5 e 10 anos para se prepararem adequadamente. Foram capacitados na igreja local, como também em instituições teológicas visando um preparo missiológico

Existe também o cuidado que se deve tomar em não queimar etapas. Se olharmos para a realidade missionária latino- americana, reconheceremos rapidamente que nosso “calcanhar de Aquiles” reside naquilo que chamamos de imediatismo.

Na verdade, aqui no Brasil, este costume junta-se a outro fator que podemos denominar de “jeitinho brasileiro”, que se traduz como aquele comportamento muito comum de realizar as tarefas que temos em nossas mãos no último momento, quando não, fora do tempo determinado. Desta maneira, se junta a rapidez inconseqüente a uma inusitada irresponsabilidade no desenvolvimento cronológico das nossas tarefas.

Da mesma forma que se entende a necessidade do preparo, entende-se também a necessidade de se evitar a procrastinação no envio do missionário. As conseqüências da demora podem ser desastrosas, levando, inclusive, o vocacionado a abandonar seu chamado porque sua igreja deixou de observar algumas etapas que deveriam ser cumpridas no tempo determinado.

A CHAMADA

Indubitavelmente, todo aquele que tem um encontro pessoal com o Senhor Jesus, passando pela experiência do novo nascimento (Jo 3.3), ou seja, conversão, e decide tornar-se um de seus seguidores (Jo 3.67-69), recebe uma chamada. Esta chamada é para apresentar e representar Jesus diante das pessoas (At 1.8), fazendo com que todos O reconheçam como seu Senhor e Salvador pessoal.

A chamada missionária, entretanto, apresenta um acréscimo na responsabilidade e comprometimento com a evangelização mundial por ser mais específica, como o próprio apóstolo Paulo salienta (1Co 9:17). Faz-se necessário dizer que a chamada missionária é, antes de qualquer outra coisa, uma chamada direta do Espírito Santo. Este foi o caso de Paulo e Barnabé (At 13:2), por exemplo, e de qualquer outro que se declare comissionado pelo Senhor. Entretanto, este texto não revela como esta chamada se deu. O mais provável é que Deus tenha falado à igreja através de seus profetas (At 13.1). Porém, também se aventa a possibilidade de que esta chamada tenha sido interna, e não externa, ou seja, através do testemunho do Espírito em seus corações e mentes.

Por outro lado, alguns cristãos colocam grande relevância no significado de uma chamada específica recebida em uma data e local específico. Contudo, missões estão fundamentadas em uma base mais forte do que em apenas um senso subjetivo de chamada de Deus.

Sem sombra de dúvida, a chamada missionária é mais complexa do que se pode imaginar. Por esta razão, uma compreensão do significado bíblico-teológico do que é a chamada missionária se faz tão necessária.

A importância de compreender com exatidão o que é vocação missionária é real e há uma perspectiva sobre seu conceito tanto no Antigo Testamento (AT) quanto no Novo (NT). Como exemplo de chamada no AT, destaca-se a de Abraão (Gn 12.1-3). Essa chamada “torna-se praticamente um referencial clássico para tudo aquilo que viria acontecer na história do povo de Israel”.

Em contrapartida, é de bom tom recordar que, em conseqüência dessa chamada, Abraão teve que romper seus laços familiares e deixar sua terra e seus amigos para trás, dentre outras coisas.

Ao se olhar para o NT, vê-se nos relatos de Mateus, Marcos e Lucas, em relação ao chamado dos discípulos, o sentido de uma “convocação imperiosa a um indivíduo ou a um grupo existente e mais ou menos bem definido como os discípulos”.

Já em Atos, pode-se ver um processo natural de desenvolvimento de chamadas. Essa convocação mencionada acima estaria sempre vinculada à comunidade dos santos, a saber, a igreja. A possibilidade de acontecer auto-chamamentos não existe, segundo a perspectiva divina. Contudo, é a teologia paulina que provê a fundamentação teológica do sentido de vocação missionária no NT.

Paulo encarnou de forma plena o sentido bíblico-teológico da vocação missionária que lhe foi concedida pelas seguintes razões:

1) Afirma que não vive mais para si mesmo, mas para Aquele que o salvou e chamou (Gl 2.20);

2) Disponibiliza-se para se preparar devidamente (Gl 1.17);

3) Dispõe-se a ser enviado por uma igreja local (At 13.1- 3);

4) Demonstra um estilo de vida que condiz com o de um missionário (Fp 4.11, 12).

5) Está disposto a sofrer por amor a Cristo (2Co 11.24-27);

O QUE CONSTITUI UM CHAMAMENTO MISSIONÁRIO?

Poucas vezes acontece algo como “um relâmpago caindo do céu”. O mais freqüente é a chamada se manifestar como uma convicção profunda e crescente, baseada em princípios bíblicos sólidos, testemunhada no interior pelo Espírito Santo e confirmada no exterior pela Igreja.

Contudo, essa perspectiva a respeito da chamada missionária não é consenso. Outros autores compartilham de uma visão um tanto diferente e afirmam que a Bíblia não apresenta, de forma clara, uma base bíblica para a chamada missionária. Dizer que há uma base bíblica para missões é subestimar toda a mensagem da Bíblia. Ao invés de argumentar a respeito da base bíblica de missões, deveríamos vê-la de outra forma – o trabalho de missões é a razão para a Bíblia. Púlpitos evangélicos, salas de aula de seminários e livros teológicos reconhecem de forma crescente e proclamam esta verdade.

A Palavra de Deus ensina que Ele é um Deus missionário com um coração pelas nações. À medida que estudamos Sua Palavra e O conhecemos mais, veremos a Missio Dei (missão de Deus) entrelaçada ao longo dela do começo ao fim. Apesar desse claro retrato de Seu coração pelas nações, Deus não define claramente a chamada missionária em nenhum lugar da Bíblia.

Nós gostaríamos muito de ter uma lista de cinco qualidades, requisitos ou passos para discernir uma chamada missionária. Infelizmente, este não é o caso. Entretanto, na verdade, a Bíblia nos ensina sobre a chamada missionária.

À medida que crescemos em nosso conhecimento de Deus através de Sua Palavra, nosso coração começa a entrar em ressonância com o Seu próprio coração.

Embora a Bíblia não forneça uma definição de chamada missionária, ela fornece um meio através do qual se pode ver o desejo de Deus pelas nações e como Ele chama pessoas para levar adiante Seus desejos.

O autor defende a tese de que os exemplos bíblicos não são prescritivos, mas sim descritivos. Não devem ser vistos como precedentes aos quais se devam comparar experiências de chamadas posteriores. Ao invés disso, tais exemplos devem demonstrar o que aconteceu quando Deus chamou pessoas em tempos diferentes na história bíblica.

O amor e o despertamento por missões são outros aspectos fundamentais no processo de chamada de um cristão. O relacionamento do discípulo com o Senhor Jesus é um relacionamento baseado em amor. O próprio Jesus declarou isso, afirmando que, se existisse amor por parte dos discípulos, a obediência aos Seus mandamentos seria uma conseqüência (Jo 14.15, 21; 15.10).

Portanto, a obediência à Grande Comissão deve também ser conseqüência desse relacionamento de amor com Jesus. “Se demonstrarmos amor e integridade através de uma vida justa e santa, estamos testemunhando de Cristo de maneira poderosa, seja qual for nossa vocação”.

Sendo assim, é o amor que deve impulsionar o discípulo à realização da obra missionária, pois, existindo amor pelo Senhor da obra, existirá amor pela obra do Senhor. Entretanto, este amor por Jesus e por Sua obra deve conduzir os seguidores de Cristo ao envolvimento com a obra missionária, seja indo ou ficando na retaguarda para sustentar o empreendimento missionário. “Grande é a responsabilidade da Igreja e do crente na promoção da obra missionária. Todos os crentes, através de suas igrejas, têm de sustentar e promover a obra”.

Como em qualquer empreendimento, a missão de Deus também se fundamenta em várias verdades motivacionais. Mas, nenhuma dessas verdades é maior do que a verdade teológica da salvação de Deus como motivação missionária. Todos aqueles que são agradecidos por sua própria salvação ficarão motivados a unirem-se a Deus em Seu empreendimento missionário.

Jesus entregou quatro diretrizes que fundamentam o mandato missionário da igreja. Essas diretrizes desafiam os seguidores de Jesus com uma chamada para envolverem-se em missões e elas servem como manual para o ministério missionário. Estas mesmas diretrizes, ou mandamentos, ainda estão em vigor para a igreja hoje: “somos enviados” (Jo 20.19-21); “a todos os povos”. Antes de chegar ao campo missionário, “com uma mensagem” (Lc 24.46-48); “capacitados pelo Espírito Santo” (At 1.6-8).13 2).
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O autor é licenciado em Letras-Inglês e respectivas literaturas pela Universidade Federal do Paraná (Curitiba, 1986); bacharel em Administração com habilitação em Comércio Exterior pela Faculdade de Estudos Sociais do Paraná (Curitiba, 1994); bacharel em Teologia pela Faculdade Teológica Batista do Paraná (Curitiba, 2009); mestre em Estudos Teológicos com ênfase em Missiologia pelo Southeastern Baptist Theological Seminary (Wake Forest, NC, EUA, 2015). Tradutor e pastor de Famílias e Missões na Igreja Batista no Jardim Ambiental em Curitiba. E-mail: prjricardo.morais@gmail.com

Publicado na Revista Batista Pioneira vol. 6 n. 2 Dezembro/2017




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