HÁ TEMPO DE CHORAR E TEMPO DE RIR


Este texto é de propriedade  e autoria do Dr. Carlos Pinto e foi publicado originalmente no Blog da COMIBAM. Siga o link abaixo;


ECLESIASTES 3:4

Anteriormente se pensava que as crianças não experimentavam momentos de depressão ou luto porque eram muito pequenas para entender que estavam experimentando uma perda emocional ou material. Foi Ana Freud quem argumentou que na infância se tem, sim, a capacidade de sentir emoções de tristeza, angústia ou pesar quando se vive perdas como: a morte de um ser querido, a morte de seu mascote e até a perda de um brinquedo ou de amizades que foram muito importantes para elas.

PERDAS OU CONFLITOS NOS FILHOS DE MISSIONÁRIOS
Dentro da comunidade missionária faz falta continuarmos a nos conscientizar sobre a nova postura dos especialistas em saúde mental, os quais nos indicam que os momentos de perdas dos filhos não devem ser subestimados. Quando os pais não validam a dor ou pena que os filhos sofrem ao haver experimentado uma perda, provoca-se confusão neles ao não compreenderem porque os adultos não entendem o conflito que estão enfrentando, o que aumenta seu sentimento de tristeza.
Recordo-me que em uma família, numa de suas primeiras viagens missionários, os pais decidiram não levar todos os brinquedos do filho de 5 anos. Para evitar pagar excesso de bagagem, decidiram escolher uns brinquedos e deixar os demais para as crianças da igreja que frequentavam. Ao chegarem no país onde serviriam, desempacotaram suas coisas e o filho notou a ausência de alguns brinquedos que, para ele, tinham maior significado que aqueles que os pais haviam trazido. Como era de se esperar, o filho entrou em um quadro de raiva e de dor por estar em um país desconhecido, onde sua casa já não era sua casa, onde seus amigos já não estavam e seus brinquedos mais apreciados não tinham sido trazidos. Seus pais pensaram que este momento de desconsolo passaria rápido, mas passaram-se os anos e o menino não esqueceu esse difícil momento de dor. E quando o menino chegou à adolescência reclamou com seus pais o fato de não terem perguntado a ele que brinquedos eram mais importantes para levar e por não terem entendido a grande dor que sentiu por este incidente.

ETAPAS DE CONFLITO NAS CRIANÇAS
As crianças, como os adultos, experimentam algumas emoções comuns quando passam por uma perda. É comum que sintam dor, tristeza, neguem o fato ou tentem mudá-lo até que finalmente o aceitam, assimilam a perda e reorientam sua vida para um estado “normal”. Em nossa cultura latino-americana e adultocêntrica, os pais evitam a dor para seus filhos e, em alguns casos extremos, até consideram ocultar a morte de um ser querido aos filhos pequenos para que não sofram.
Deus não o quer, mas é possível que o falecimento de um familiar possa ocorrer quando a família missionária está no campo e, logicamente, a distância impede que se participe do culto memorial ou dos serviços fúnebres. Se isto ocorre, é importante não ocultar das crianças o sucedido “para evitar a dor”, pois isso seria um erro; pelo contrário, deve-se usar essa oportunidade para ensinar ao menino ou menina sobre a vida e a morte. Em ocasiões como estas, pode-se ensinar aos filhos que quando se perde alguém ou algo, isso nos provoca tristeza ou dor e que é necessário expressá-las e falar com seus pais para que eles os consolem.

Emoções similares experimentaram os filhos de missionários quando seus pais os trocaram de uma escola para outra, por diversas razões. Deixar de pertencer ao grupo de amigos com quem brincava ou socializava provoca também sentimentos de perda. É necessário e é de ajuda falar sobre estes assuntos na infância ou adolescência, de forma concreta e de acordo com a idade dos filhos. É importante ter em conta que muitas vezes os menores de idade não expressam em palavras o fato de estarem tristes ou deprimidos. Muitas vezes o manifestam através de comportamentos agressivos, que antes não haviam demonstrado.
Identificar a idade da criança quando experimenta una perda, ajuda a entender a manifestação de sua dor. Quando é menor, a criança pode associar a perda a um erro cometido. Por exemplo, uma família missionária havia dado uma iguana de presente, como mascote, a seu filho pequeno e haviam levado o animalzinho de um país ao outro, até que chegou um dia em que a iguana morreu. O filho chorava desconsoladamente e dizia à mãe que a iguana havia morrido porque ele não soube cuidar bem dela. Esta é uma reação normal no mundo da criança por estar numa etapa onde ela crê que tudo gira ao seu redor e que tudo o que é bom ou mal é causado por ela. Em situações como estas, é importante que os pais recebam o choro ou o desconsolo do filho, mas que, ao mesmo tempo, possam ajudá-lo a entender que não tem que se culpar. Tirar o sentimento de culpa dele é muito necessário, com uma explicação realista, objetiva e concreta.

CONSIDERAÇÕES
1- Pergunte que significado tinha o que foi perdido (pessoa, objeto, mascote, relação) para seu filho e considere esta dimensão ao validar seus sentimentos e ao consolá-lo.
2- Avalie se seu filho ou filha passou por um evento similar de perda anteriormente. Pergunte-se como assimilou ou não o evento anterior e entenda que se a perda anterior não foi superada é normal que sinta a perda nova mais intensamente, o que requererá mais paciência de você.
3- Esteja consciente que cada filho, de acordo com sua idade e sua personalidade, reagirá de maneira diferente à mesma perda. Cada um vive seu processo de dor, tristeza, luto e aceitação de forma diferente.
4- Aceite a dor, sofrimento ou luto que o filho sinta e o ajude a entender que é normal esta reação, mas que será temporária e que é importante que fale sobre isso para que possa, no tempo dele, superar este momento.
5- Explique que a vida da família missionária implica viajar, deixar seu país para ir morar em outros lugares, distantes da família, amigos etc. E que a razão é mostrar o amor de Deus a outras pessoas, o que causa dor, mas também alegrias, como conhecer muitos lugares diferentes e conhecer muita gente nova cada vez que se mudam. Quão formosos são os pés do que anunciam o evangelho da paz, que pregam o evangelho (Romanos 10.15)
Os filhos de missionários não são super-filhos, que não sentem dor pelas mudanças e perdas que experimentam na vida missionária. Pelo contrário, os filhos de missionários estão expostos, muitas vezes, a mais mudanças e perdas que as crianças que vivem em seu próprio país, com suas famílias, em um ambiente mais estável. Por esta razão, seus pais precisam informar-se sobre como seus filhos enfrentam suas perdas e vivem seu conflito para poder acompanhá-los de forma apropriada, recebendo-os e aceitando suas expressões de sofrimento e luto, mostrando a eles que vocês estão ali para protegê-los e esclarecer qualquer confusão que possam ter.
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Dr. Carlos Pinto
Psicólogo clínico e de família
Cuidado Integral do Missionário
COMIBAM INTERNACIONAL



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